É a pergunta que uma pesquisa conduzida pela BBC faz para os voluntários, tentando esclarecer quais são as variáveis envolvidas nos sucesso ou no fracasso das pessoas quando elas se submetem a uma tarefa que envolvem níveis significativos de pressão emocional.
O link para quem estiver interessado em participar da pesquisa é o seguinte: https://ssl.bbc.co.uk/labuk/experiments/compete/
No final, seu desempenho é analisado por Michael Johnson, multimedalhista olímpico.
Hiperestesia
Psicologia, Sociologia, Cultura. Resgatando o antigo blog Hiperestesias.
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
Primeira Parte: A Grande Chuva
- Dé!
- Dé! O campinho já está bom! Não tem mais lama.
Dé ouve, mas prefere não responder ao chamado.
- Dé! O Zinho quer você no time dele!
Dé se esconde embaixo da cama. Agarra-se à bola feita de gomos remendados e chora. Apesar dos soluços involuntários, tenta não se mexer muito, posto que seu corpo, arroxeado de cima abaixo, ainda dói. Evita até fechar a boca e encostar os dentes, já que um dos golpes lhe machucara o maxilar. Desde o dia em que a enchente inundou a rua de baixo, passa a maior parte das horas no quarto que divide com o irmão, olhando para sua bola, um dos poucos brinquedos que possui. Lembra do dia da grande chuva, da primeira vez que fizera um gol contra o time do Zinho, o jogador mais habilidoso da vizinhança e um ano mais velho do que ele.
O Zinho quase nunca perdia um jogo contra o time da rua do Dé. Além de bom driblador e matador oportunista, qualidades obrigatórias de qualquer bom centroavante, o negrinho raquítico, esticado, de joelhos bolachudos e olhos sempre arregalados, era líder. Sabia escolher bem seus jogadores e fazia com que todos o obedecessem. No jogo do Zinho, o seu comando transformava a pelada despretensiosa num balé malandro onde a coreografia era marcada pelo vai e vem da bola, a confundir o adversário, e cujo ato final era sempre o chute certeiro e elegante do bailarino principal. O time era montado exclusivamente para lhe servir. Talento e egoísmo que lhe renderam, tempos depois, muitas glórias profissionais e muitas desgraças pessoais.
Mas no dia da grande chuva, o aguaceiro que caiu do céu atrapalhou muito o time-orquestra do Zinho. O campinho ficou empoçado. Uma lama preta atolava os pés e não deixava a bola rolar. Era um futebol feio de se ver, os corpos se emporcalhavam, escorregavam em freadas bruscas quando a bola empacava numa poça. Os meninos batizavam-se de um caldo negro e espesso. Alguns garotos meio que desistiam do futebol e se divertiam mais com os carrinhos - oportunidade em que deslizavam deliciosamente sobre a lama - que com a tentativa de um chute a gol.
O Zinho se irritava. Ele gostava de um jogo rasteiro, preciso. Apreciava ver a pelota sendo rolada de pé em pé e pensava que bola alta não era coisa de futebol. Seus dribles eram no chão, nunca arriscava um chapéu, ainda que sua altura o pudesse favorecer. Aquele lamaçal o estava deixando irado. Lá pelas tantas, em ato de desespero, deu um bicudo do meio do campo, com tal força - algo um tanto surpreendente para aquele corpo acanhado - que a bola costurada do Dé, ao atingir a quina da trave, deixara para trás um de seus gomos.
No dia daquele jogo, no dia da grande chuva, Dé, dono da bola, apenas observava o jogo de fora. Depois do bicudo do Zinho, recolheu o gomo que saltara da bola e o guardou no bolso. Era necessário costurar o brinquedo após a partida. Dé cuidava bem de seu brinquedo porque o havia fabricado. Aquela bola não tinha um dono, tinha um criador. Surgira do esforço daquele menino, que por cerca de duas semanas havia revirado o lixo de todas as ruas do bairro para achar restos de outras bolas largados por aí. Cada pedaço de couro achado era uma nova peça a se encaixar no quebra-cabeça costurado por Dé para revestir o interior emborrachado, encontrado no caminho da escola. Por sorte, a válvula da peça de borracha ainda estava preservada.
Não demorou e o brinquedo tornou-se a maior diversão dos meninos do bairro. Diariamente, uma procissão de moleques descalços subia a ladeira do bairro para jogar no campinho da Rua de Cima, um terreno de barro preto bem em frente à casa do Dé.
Encoberto pela penumbra do quarto, Dé relembra que nunca tinha visto o Zinho com tanta raiva. Após o chute que acertara trave, o pequeno craque, com sua ira em ascensão, acertou uma cotovelada no Marcelinho, que tentava lhe roubar a bola. O sangue escorreu rápido pelo nariz do golpeado e o tempo fechou em volta do Zinho. Queriam expulsá-lo. Esboçou-se um princípio de briga, mas os amigos do agressor o protegeram e ninguém mais ousou tirar o Zinho do jogo.
O Marcelinho, coitado, correu chorando para sua casa. Precisavam de um substituto. Alguém apontou para o Dé, que, àquela altura, já entendera a saída para aquele jogo lamacento.
E foi então que logo no primeiro lance após o incidente da cotovelada o Dé entrou em campo e se viu, afortunadamente, diante da bola, paradinha, quase boiando numa poça, depois de uma dividida que deixara dois pirralhos deitados na lama. Dé hesitou um segundinho apenas, o suficiente para que o Zinho arrancasse em sua direção. Já o momento seguinte viria a testemunhar algo que os garotos do bairro ainda lembrariam anos depois.
Dé fincou o pé na lama e, com um movimento rápido, ejetou a bola acima de si e deu um passo para o lado. Neste ínfimo intervalo de tempo, – porque os grandes momentos são prófugos - viu o Zinho passar à sua frente, com os olhos ainda mais esbugalhados, escorregando, desequilibrando, parecendo que dava passos para trás, querendo voltar, não acreditando no que estava acontecendo. A bola fez uma parábola no alto, acima da cabeça do Zinho, e voltou num piscar de olhos após, ao pé do Dé, que a dominara com maestria, antes que voltasse a atingir a água novamente. Dé ficou assim, tão paralisado quando a bola equilibrada em seu pé direito, a observar o Zinho tentando se levantar da queda. Estava boquiaberto.
Não demorou para que o Zinho, com os grandes olhos agora vermelhos de raiva, iniciasse nova perseguição.
Dé deixou de ser estátua, moveu-se com a bola fazendo embaixadas, dando chapéus nos adversários, dobrando seu corpo tal qual contorcionista para não se deixar escorregar. Seguia na direção do gol sem saber. Na verdade, fugia do Zinho, que patinava na lama, furiosamente, em sua direção.
Dé poderia simplesmente sair correndo, seria até mais fácil, mas havia dentro de si um não sei que de grude com aquela bola que não permitia abandoná-la.
Foi somente quando estava de frente para o Júlio, o goleiro, que Dé voltou a si. Enxergou o último movimento que lhe restava fazer. Sem nenhuma cerimônia, ante a aproximação do Júlio, tocou por cobertura. O Júlio ainda saltou, se esticou, gemeu, mas o máximo que conseguiu foi tocar de raspão um pedaço de couro que se desprendia da pelota.
Gol!
Os momentos seguintes poderiam ter visto o Dé comemorar seu primeiro gol no campinho. Os garotos do bairro o teriam visto correr de braços abertos até a graminha que demarcava seus limites. Ou, quem sabe, o novo artilheiro teria simplesmente fugido do Zinho, que o mirava feito predador a fitar sua presa.
Antes que o Dé pudesse levantar os braços para comemorar, antes que pudesse pensar em fugir, sentiu um forte solavanco atrás de si. Caiu de frente, com a face socada na lama. Tentou respirar, mas engoliu mais barro do que ar. Lembrou de quem o perseguia, mas não entendia como seu rival, habilidoso, porém magrelo, seria capaz de desferir um golpe tão duro, pesado, dolorido. Levantou a cabeça, mas logo veio outra pancada, no lado direito do rosto. Não demorou a reconhecer o volume do impacto, de forma que não ficou mais surpreso quando ouviu uma voz grave e encorpada lhe ordenar: “levanta daí, moleque”.
Era o seu pai.
(Continua)
- Dé! O campinho já está bom! Não tem mais lama.
Dé ouve, mas prefere não responder ao chamado.
- Dé! O Zinho quer você no time dele!
Dé se esconde embaixo da cama. Agarra-se à bola feita de gomos remendados e chora. Apesar dos soluços involuntários, tenta não se mexer muito, posto que seu corpo, arroxeado de cima abaixo, ainda dói. Evita até fechar a boca e encostar os dentes, já que um dos golpes lhe machucara o maxilar. Desde o dia em que a enchente inundou a rua de baixo, passa a maior parte das horas no quarto que divide com o irmão, olhando para sua bola, um dos poucos brinquedos que possui. Lembra do dia da grande chuva, da primeira vez que fizera um gol contra o time do Zinho, o jogador mais habilidoso da vizinhança e um ano mais velho do que ele.
O Zinho quase nunca perdia um jogo contra o time da rua do Dé. Além de bom driblador e matador oportunista, qualidades obrigatórias de qualquer bom centroavante, o negrinho raquítico, esticado, de joelhos bolachudos e olhos sempre arregalados, era líder. Sabia escolher bem seus jogadores e fazia com que todos o obedecessem. No jogo do Zinho, o seu comando transformava a pelada despretensiosa num balé malandro onde a coreografia era marcada pelo vai e vem da bola, a confundir o adversário, e cujo ato final era sempre o chute certeiro e elegante do bailarino principal. O time era montado exclusivamente para lhe servir. Talento e egoísmo que lhe renderam, tempos depois, muitas glórias profissionais e muitas desgraças pessoais.
Mas no dia da grande chuva, o aguaceiro que caiu do céu atrapalhou muito o time-orquestra do Zinho. O campinho ficou empoçado. Uma lama preta atolava os pés e não deixava a bola rolar. Era um futebol feio de se ver, os corpos se emporcalhavam, escorregavam em freadas bruscas quando a bola empacava numa poça. Os meninos batizavam-se de um caldo negro e espesso. Alguns garotos meio que desistiam do futebol e se divertiam mais com os carrinhos - oportunidade em que deslizavam deliciosamente sobre a lama - que com a tentativa de um chute a gol.
O Zinho se irritava. Ele gostava de um jogo rasteiro, preciso. Apreciava ver a pelota sendo rolada de pé em pé e pensava que bola alta não era coisa de futebol. Seus dribles eram no chão, nunca arriscava um chapéu, ainda que sua altura o pudesse favorecer. Aquele lamaçal o estava deixando irado. Lá pelas tantas, em ato de desespero, deu um bicudo do meio do campo, com tal força - algo um tanto surpreendente para aquele corpo acanhado - que a bola costurada do Dé, ao atingir a quina da trave, deixara para trás um de seus gomos.
No dia daquele jogo, no dia da grande chuva, Dé, dono da bola, apenas observava o jogo de fora. Depois do bicudo do Zinho, recolheu o gomo que saltara da bola e o guardou no bolso. Era necessário costurar o brinquedo após a partida. Dé cuidava bem de seu brinquedo porque o havia fabricado. Aquela bola não tinha um dono, tinha um criador. Surgira do esforço daquele menino, que por cerca de duas semanas havia revirado o lixo de todas as ruas do bairro para achar restos de outras bolas largados por aí. Cada pedaço de couro achado era uma nova peça a se encaixar no quebra-cabeça costurado por Dé para revestir o interior emborrachado, encontrado no caminho da escola. Por sorte, a válvula da peça de borracha ainda estava preservada.
Não demorou e o brinquedo tornou-se a maior diversão dos meninos do bairro. Diariamente, uma procissão de moleques descalços subia a ladeira do bairro para jogar no campinho da Rua de Cima, um terreno de barro preto bem em frente à casa do Dé.
Encoberto pela penumbra do quarto, Dé relembra que nunca tinha visto o Zinho com tanta raiva. Após o chute que acertara trave, o pequeno craque, com sua ira em ascensão, acertou uma cotovelada no Marcelinho, que tentava lhe roubar a bola. O sangue escorreu rápido pelo nariz do golpeado e o tempo fechou em volta do Zinho. Queriam expulsá-lo. Esboçou-se um princípio de briga, mas os amigos do agressor o protegeram e ninguém mais ousou tirar o Zinho do jogo.
O Marcelinho, coitado, correu chorando para sua casa. Precisavam de um substituto. Alguém apontou para o Dé, que, àquela altura, já entendera a saída para aquele jogo lamacento.
E foi então que logo no primeiro lance após o incidente da cotovelada o Dé entrou em campo e se viu, afortunadamente, diante da bola, paradinha, quase boiando numa poça, depois de uma dividida que deixara dois pirralhos deitados na lama. Dé hesitou um segundinho apenas, o suficiente para que o Zinho arrancasse em sua direção. Já o momento seguinte viria a testemunhar algo que os garotos do bairro ainda lembrariam anos depois.
Dé fincou o pé na lama e, com um movimento rápido, ejetou a bola acima de si e deu um passo para o lado. Neste ínfimo intervalo de tempo, – porque os grandes momentos são prófugos - viu o Zinho passar à sua frente, com os olhos ainda mais esbugalhados, escorregando, desequilibrando, parecendo que dava passos para trás, querendo voltar, não acreditando no que estava acontecendo. A bola fez uma parábola no alto, acima da cabeça do Zinho, e voltou num piscar de olhos após, ao pé do Dé, que a dominara com maestria, antes que voltasse a atingir a água novamente. Dé ficou assim, tão paralisado quando a bola equilibrada em seu pé direito, a observar o Zinho tentando se levantar da queda. Estava boquiaberto.
Não demorou para que o Zinho, com os grandes olhos agora vermelhos de raiva, iniciasse nova perseguição.
Dé deixou de ser estátua, moveu-se com a bola fazendo embaixadas, dando chapéus nos adversários, dobrando seu corpo tal qual contorcionista para não se deixar escorregar. Seguia na direção do gol sem saber. Na verdade, fugia do Zinho, que patinava na lama, furiosamente, em sua direção.
Dé poderia simplesmente sair correndo, seria até mais fácil, mas havia dentro de si um não sei que de grude com aquela bola que não permitia abandoná-la.
Foi somente quando estava de frente para o Júlio, o goleiro, que Dé voltou a si. Enxergou o último movimento que lhe restava fazer. Sem nenhuma cerimônia, ante a aproximação do Júlio, tocou por cobertura. O Júlio ainda saltou, se esticou, gemeu, mas o máximo que conseguiu foi tocar de raspão um pedaço de couro que se desprendia da pelota.
Gol!
Os momentos seguintes poderiam ter visto o Dé comemorar seu primeiro gol no campinho. Os garotos do bairro o teriam visto correr de braços abertos até a graminha que demarcava seus limites. Ou, quem sabe, o novo artilheiro teria simplesmente fugido do Zinho, que o mirava feito predador a fitar sua presa.
Antes que o Dé pudesse levantar os braços para comemorar, antes que pudesse pensar em fugir, sentiu um forte solavanco atrás de si. Caiu de frente, com a face socada na lama. Tentou respirar, mas engoliu mais barro do que ar. Lembrou de quem o perseguia, mas não entendia como seu rival, habilidoso, porém magrelo, seria capaz de desferir um golpe tão duro, pesado, dolorido. Levantou a cabeça, mas logo veio outra pancada, no lado direito do rosto. Não demorou a reconhecer o volume do impacto, de forma que não ficou mais surpreso quando ouviu uma voz grave e encorpada lhe ordenar: “levanta daí, moleque”.
Era o seu pai.
(Continua)
domingo, 9 de dezembro de 2012
Natal Literário
O excelente site releituras preparou uma lista de contos, poesias e crônicas de imortais escritores brasileiros com temas natalinos. A lista é grande, mas destaco aqui duas poesias que ajudam a refletir sobre as expectativas de tempos melhores que começam a encher nossos corações no último e mais quente mês do "bê-érre-ó-bró":
1. Esperança (Mário Quintana)
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...
2. Cartão de Natal (João Cabral de Melo Neto)
Pois que reinaugurando essa criança
pensam os homens
reinaugurar a sua vida
e começar novo caderno,
fresco como o pão do dia;
pois que nestes dias a aventura
parece em ponto de vôo, e parece
que vão enfim poder
explodir suas sementes:
que desta vez não perca esse caderno
sua atração núbil para o dente;
que o entusiasmo conserve vivas
suas molas,
e possa enfim o ferro
comer a ferrugem
o sim comer o não.
Ainda sob a autoria de João Cabral de Melo Neto, sempre vale a pena reler "Morte e Vida Severina", para mim, o auto de Natal mais bonito e mais brasileiro.
1. Esperança (Mário Quintana)
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...
2. Cartão de Natal (João Cabral de Melo Neto)
Pois que reinaugurando essa criança
pensam os homens
reinaugurar a sua vida
e começar novo caderno,
fresco como o pão do dia;
pois que nestes dias a aventura
parece em ponto de vôo, e parece
que vão enfim poder
explodir suas sementes:
que desta vez não perca esse caderno
sua atração núbil para o dente;
que o entusiasmo conserve vivas
suas molas,
e possa enfim o ferro
comer a ferrugem
o sim comer o não.
Ainda sob a autoria de João Cabral de Melo Neto, sempre vale a pena reler "Morte e Vida Severina", para mim, o auto de Natal mais bonito e mais brasileiro.
quinta-feira, 6 de dezembro de 2012
Por um Natal menos ranzinza
Certa vez, em um restaurante, enquanto esperava na fila para pagar a conta, uma senhora iniciou o assunto sobre o Natal. Num misto de alegria e pressa, ela disparava para os ouvintes mais próximos a odisséia de seus preparativos para as festas. Decoração da casa, peru para a ceia, presentes para filhos, noras, netos e o sentimento gostoso de quem anseia por reencontros e momentos felizes no final de mais um ano.
Um senhor de olhar severo e ranzinza, que observava tudo a meia distância, intrometeu-se no relato da entusiasmada mulher e mandou uma das máximas mais mal-humoradas e repetidas que antecedem o Natal: “acho que essa história de Natal é tudo uma invenção do comércio para lucrar em cima dos presentes que compramos para as outras pessoas”. A pobre senhora nada disse sobre a assertiva do interlocutor indesejado e apenas se arrumou na fila para pagar sua conta. Talvez como um protesto, nenhuma outra pessoa disse algo até que todos saíssem do restaurante, cada um com o seu rumo.
Da mesma forma com a qual o Natal preenche de alegria muita gente, parece também despertar o lado mal-humorado de algumas pessoas. É óbvio que, em tempos de hipermodernidade, modernidade líquida ou pós modernidade (onde prolifera a ênfase dada ao consumo como uma forma de usufruto da felicidade), ainda são muitos os excluídos, os que passam fome, os que não vão comprar nem receber presentes, os que não terão ceia. E ainda há os que estarão sofrendo perdas, os que estarão enfermos e assim por diante. As misérias humanas são muitas, mas será que isso é motivo para descartar o Natal como uma festa de congraçamento entre as pessoas?
Faço aqui uma proposta àqueles que se tornam ranzinzas com a proximidade do feriado natalino, uma proposta aos que assumem o discurso pessimista de que nunca há o que comemorar: talvez seja bom aproveitar um pouquinho desse sentimento de indignação perante as desigualdades e comemorar o Natal arregaçando as mangas e buscando se engajar voluntariamente em campanhas natalinas para tentar mudar pelo menos uma pequena parte desse mundo que, presume-se, é tão horrível assim; talvez seja saudável não assumir uma visão fatalista do mundo, pois assim, nunca haverá algo para se festejar.
Proponho assumir que este feriado, longe de ser apenas um pretexto para o consumismo desenfreado, possa ser uma lembrança de que devemos e podemos ser solidários com as outras pessoas. Garanto que todos se sentirão recompensados e sairão deste Natal com o gostinho de que alguma coisa neste mundo pode mudar para melhor.
Há também a possibilidade mais simples, mas não menos válida, de fazer um esforço para buscar a harmonia com a família e os amigos mais próximos. Talvez o Natal seja apenas isso, um lembrete para cultivar a paz.
Mas se preferir, mais um Natal ranzinza já está batendo à porta.
Hamilton Ayres.
"Neguinho"
O “neguinho” era o garoto mais discriminado de nosso bairro, quero dizer, não do nosso bairro, pois ele não morava no conjunto habitacional de famílias pertencentes ao que normalmente se chama de classe média. “Neguinho” morava no bairro vizinho, onde não chegava a rede de esgoto e as ruas eram de barro batido. Eu nunca soube direito onde era exatamente a casa do “neguinho”, assim como não consigo me lembrar do seu verdadeiro nome, só sei que ele sempre aparecia em nossa rua para brincar conosco e era assim que o chamávamos, naturalizando um apelido originalmente pejorativo, devido à cor de sua pele.
Ainda que não fôssemos ricos, a distância social entre a nossa turma e o “neguinho” era inconteste. “Neguinho” não tinha brinquedos, ou melhor, até tinha, mas não eram comprados em loja e nem apareciam em anúncios da TV. Ele mesmo os fabricava. Uma pipa feita de plástico e talo de palha de coqueiro, carrinhos de pau, bola de meia e coisas desse tipo. Suas roupas sempre eram mais sujas e mais rasgadas que as nossas, seu corpo mais desnutrido.
E nós também éramos mais mimados. Eu, por exemplo, tinha limites geográficos precisos. Só podia brincar na outra rua em situações muito raras e com a autorização de pai e mãe sempre muito preocupados com quem andávamos ou com o que fazíamos. O “neguinho” não. Ele transitava livre pelas ruas e parecia não ter hora para voltar à sua casa. Ele também era mais ágil, subia melhor em árvores e muros e quando fugia ninguém conseguia capturá-lo.
Mas ainda não ficou claro porque ou como o “neguinho” era discriminado em nossa rua. Talvez, enquanto crianças, também não soubéssemos como isso acontecia, mas o fato é que em nossas brincadeiras, ele quase sempre era humilhado. Se jogávamos bola, exigíamos que o “neguinho” esperasse várias partidas como gandula até que déssemos a ele o direito de participar. E nós sempre exagerávamos em chutes cada vez mais distantes para que ele sofresse ainda mais com a espera.
E lá ia o neguinho, apressado, xingando nossas mães e confirmando para nós sua suposta inferioridade, posto que, apesar de tudo, ele acabava por aceitar sua condição. Nós ríamos, fazíamos piada sobre ele e, às custas do seu sofrimento, nos divertíamos.
Nas brincadeiras mais viris e violentas o “neguinho” tinha livre acesso. Mas isso acontecia porque a malhação acontecia no próprio jogo. Tudo era motivo para fazê-lo perdedor, tudo era motivo para imputar-lhe uma pena. E assim ocorria que nos “sete pecados” e no “garrafão” – brincadeiras que eu era proibido pelos meus pais de participar – o “neguinho” era sempre o que mais apanhava.
Lembro do “neguinho” em algumas festas de aniversário. Isso mesmo, o neguinho às vezes era convidado para bolo, refrigerante e lembrancinha, mas não me lembro de alguma vez terem convidado os seus pais. Será que nossos pais não os queriam por lá?
E eu ainda hoje não consigo entender porque o “neguinho” sempre voltava à nossa rua. Qual era a sua necessidade? O que ele procurava ali no local em que provavelmente ele era mais humilhado? Na sua casa seria pior? A única questão que posso responder hoje é que, para nós, aquele menino de pele negra e corpo franzino cumpria uma função expurgatória. Ele talvez fosse tudo aquilo que temíamos ser: pobres, mal vestidos, de pais ausentes e pele negra. Ter o “neguinho” por perto era como ter a confirmação de que não estávamos do lado esquecido da sociedade, aquele lado que costumávamos ver pela janela do carro quando íamos para a escola, aquele mundo de crianças de pés descalços e esgoto a céu aberto.
Eu já era adolescente quando mudei de cidade e nunca mais tive notícias do “neguinho”. Não sou capaz de prever o impacto que nossas ações possam ter tido para a vida dele. Hoje sinto vergonha do que fizemos a ele e desencanto por saber que não fomos inocentes na infância. Sempre há uma maldade em alguns atos da infância, sempre há algo do que se arrepender, sempre há algo que pode ser irremediável.
Hamilton Ayres Freire de Andrade
Ainda que não fôssemos ricos, a distância social entre a nossa turma e o “neguinho” era inconteste. “Neguinho” não tinha brinquedos, ou melhor, até tinha, mas não eram comprados em loja e nem apareciam em anúncios da TV. Ele mesmo os fabricava. Uma pipa feita de plástico e talo de palha de coqueiro, carrinhos de pau, bola de meia e coisas desse tipo. Suas roupas sempre eram mais sujas e mais rasgadas que as nossas, seu corpo mais desnutrido.
E nós também éramos mais mimados. Eu, por exemplo, tinha limites geográficos precisos. Só podia brincar na outra rua em situações muito raras e com a autorização de pai e mãe sempre muito preocupados com quem andávamos ou com o que fazíamos. O “neguinho” não. Ele transitava livre pelas ruas e parecia não ter hora para voltar à sua casa. Ele também era mais ágil, subia melhor em árvores e muros e quando fugia ninguém conseguia capturá-lo.
Mas ainda não ficou claro porque ou como o “neguinho” era discriminado em nossa rua. Talvez, enquanto crianças, também não soubéssemos como isso acontecia, mas o fato é que em nossas brincadeiras, ele quase sempre era humilhado. Se jogávamos bola, exigíamos que o “neguinho” esperasse várias partidas como gandula até que déssemos a ele o direito de participar. E nós sempre exagerávamos em chutes cada vez mais distantes para que ele sofresse ainda mais com a espera.
E lá ia o neguinho, apressado, xingando nossas mães e confirmando para nós sua suposta inferioridade, posto que, apesar de tudo, ele acabava por aceitar sua condição. Nós ríamos, fazíamos piada sobre ele e, às custas do seu sofrimento, nos divertíamos.
Nas brincadeiras mais viris e violentas o “neguinho” tinha livre acesso. Mas isso acontecia porque a malhação acontecia no próprio jogo. Tudo era motivo para fazê-lo perdedor, tudo era motivo para imputar-lhe uma pena. E assim ocorria que nos “sete pecados” e no “garrafão” – brincadeiras que eu era proibido pelos meus pais de participar – o “neguinho” era sempre o que mais apanhava.
Lembro do “neguinho” em algumas festas de aniversário. Isso mesmo, o neguinho às vezes era convidado para bolo, refrigerante e lembrancinha, mas não me lembro de alguma vez terem convidado os seus pais. Será que nossos pais não os queriam por lá?
E eu ainda hoje não consigo entender porque o “neguinho” sempre voltava à nossa rua. Qual era a sua necessidade? O que ele procurava ali no local em que provavelmente ele era mais humilhado? Na sua casa seria pior? A única questão que posso responder hoje é que, para nós, aquele menino de pele negra e corpo franzino cumpria uma função expurgatória. Ele talvez fosse tudo aquilo que temíamos ser: pobres, mal vestidos, de pais ausentes e pele negra. Ter o “neguinho” por perto era como ter a confirmação de que não estávamos do lado esquecido da sociedade, aquele lado que costumávamos ver pela janela do carro quando íamos para a escola, aquele mundo de crianças de pés descalços e esgoto a céu aberto.
Eu já era adolescente quando mudei de cidade e nunca mais tive notícias do “neguinho”. Não sou capaz de prever o impacto que nossas ações possam ter tido para a vida dele. Hoje sinto vergonha do que fizemos a ele e desencanto por saber que não fomos inocentes na infância. Sempre há uma maldade em alguns atos da infância, sempre há algo do que se arrepender, sempre há algo que pode ser irremediável.
Hamilton Ayres Freire de Andrade
quarta-feira, 13 de junho de 2012
A Cidade e o Medo
Em seu livro “Medo e Confiança na Cidade”, o sociólogo Zygmunt Bauman alerta para as recentes transformações ocorridas nas grandes cidades na época chamada por ele de “modernidade líquida”. O autor traça um território demarcado pela insegurança, pelo medo e pelas incertezas de um mundo que se fragmenta a passos largos.
A cidade de nossa recente modernidade difere muito dos primeiros conglomerados urbanos, que tinham como função proteger a comunidade contra inimigos externos. Muros e fossos eram construídos no intuito de impedir invasões indesejadas. Os que estavam “dentro” constituíam certa unidade em detrimento dos que estavam “fora”. Um sentido de comunidade era formado e a necessidade de proteção era um dos principais motivos para a constituição das cidades.
Ao longo da história, a cidade sempre exerceu um grande poder de atração, seja pelo interesse primário de proteção, seja pelas inúmeras oportunidades que oferece. Experiências incríveis são oferecidas no cotidiano dos grandes centros urbanos: gente diversa, cultura de vanguarda, grandes centros de estudo e a constante promessa de viver o novo, o diferente, o inesperado. É uma atividade interessante observar os habitantes mais jovens das cidades – aqueles que mais desfrutam das chances oferecidas no espaço urbano – transitarem pelas ruas com seus aparelhos de som portáteis, carregando mochila nas costas e se alimentando de fast-food. Tudo neles indica a procura pelo novo, pelo inédito da vida.
Mas será que esse mundo de aventuras é algo que está acessível a todos? O que dizer da clivagem social, da marginalização que a cidade promove? O que dizer da massa de mendigos e sem-teto? O que dizer dos menores de rua, da prostituição infantil, dos viciados em crack e de toda sorte de gente perdida, descartada, empurrada para longe de nossa visão?
Há alguns anos, na cidade de João Pessoa, uma escola de crianças abastadas realizou uma excursão com seus alunos - bem fardados, bem cuidados e “bem cheirosos” – ao famoso e já extinto “Lixão do Roger”, depósito de lixo a céu aberto, desses em que urubus e seres humanos famintos disputam entre si os dejetos da sociedade de consumo. O pretexto da escola, muito bem explicado na reportagem da rede de TV local, era o de mostrar aos seus alunos a realidade de um outro tipo de infância – por que não dizer, maltrapilha, mal cuidada, malcheirosa – à qual eles não poderiam conhecer na realidade de suas vidas assépticas. Ao assistir a reportagem, fiquei esperando se existiria a contrapartida, ou seja, aquelas crianças com os rostos pretos da mistura entre o catarro e a imundície do lixo, talvez tivessem a oportunidade de pelo menos passar um dia na escola de bairro rico. Mas isso não seria e de fato não foi possível. No término da “visita”, as crianças de farda branca impecável voltaram ao ônibus da escola, enquanto as outras, sujas, permaneceram lá, fixadas no local de onde não conseguem sair.
O lixo mais horrendo que a cidade produz é o lixo humano. Uma gente invisível que, por sua insignificância em relação às grandes preocupações urbanas e por não contribuírem com seus motivos econômicos, incomodam, causam medo e repulsa. Para Bauman, o drama dessa “subclasse” é a impossibilidade de se desvencilhar de sua miserável territorialidade, da incapacidade de transitarem livremente nos espaços reservados ao usufruto de todas as benesses oferecidas pela cidade. Restam-lhes os espaços marginalizados, associados ao perigo e ao medo.
O grande privilégio dos mais favorecidos na modernidade recente é a indiferença que vem a reboque da vertigem do trânsito veloz daqueles que somente passam por cima das regiões marginalizadas da cidade. Eles não precisam se fixar a lugar algum e, caso algo os incomode na vizinhança, podem rapidamente mudar de residência. Seus laços com a cidade são precários.
Os cidadãos que alcançam esse ideal estão cada vez mais descomprometidos com a cidade, posto que apenas o espaço do trabalho e a reclusão em condomínios e locais de lazer cada vez mais fortificados – uma forma de mantê-los apartados dos territórios perigosos, tenebrosos, marginalizados – lhes interessam.
A reação que a maioria tem ao se deparar com a miséria, acredito, é o medo. Evita-se o contato com a parte miserável porque, na realidade urbana, miséria e criminalidade têm andado de mãos dadas. Procura-se hoje a proteção contra os inimigos que habitam a cidade, o que deixa clara a intenção de se proteger de um inimigo que é também nosso vizinho excluído.
Por isso, arrisco dizer que as crianças abastadas que visitaram o lixão em João Pessoa aprenderam não o olhar de solidariedade e de compaixão. Acredito que elas não aprenderam uma lição de justiça social e inclusão. Elas aprenderam, sobretudo, uma lição de MEDO. Medo de viver na imundície, medo de não ser criança, medo de se tornar um quase bicho. Com esse medo no peito, muito provavelmente elas se transformarão nos adultos indiferentes e temerosos no futuro.
Hamilton Ayres Freire de Andrade
--------------
Vale a pena rever o que Mia Couto tem a dizer sobre o medo:
Vale a pena rever o que Mia Couto tem a dizer sobre o medo:
terça-feira, 12 de junho de 2012
O país que não é nosso
Certa vez, numa de minhas férias em Salvador, fiquei estupefato com uma notícia na capa do jornal "A Tarde". Uma foto grande e colorida mostrava o lindo mar azul da Bahia ao fundo, maculado pela cena principal que exibia um soldado da PM pisando o rosto de um rapaz negro deitado na areia da praia. A notícia relatava que o jovem era suspeito de roubar a bolsa de uma turista espanhola.
À mesma época, eu estava lendo "O povo brasileiro" de Darcy Ribeiro. Existe uma passagem no livro que me fez pensar bastante sobre a matéria no jornal:
"Fala-se muito da preguiça brasileira, atribuída tanto ao índio indolente, como ao negro fujão e até às classes dominantes viciosas. Tudo isso é duvidoso demais frente ao fato do que aqui se fez. E se fez muito, como a construção de toda uma civilização urbana nos séculos de vida colonial, incomparavelmente mais pujante e mais brilhante do que aquilo que se verificou na América do Norte, por exemplo. A questão que se põe é entender por que eles, tão pobres e atrasados, rezando em suas igrejas de tábua, sem destaque em qualquer área de criatividade cultural, ascenderam plenamente à civilização industrial, enquanto nós mergulhávamos no atraso."
"As causas desse descompasso devem ser buscadas em outras áreas. O ruim aqui, e efetivo fator causal do atraso, é o modo de ordenação da sociedade, estruturada contra os interesses da população, desde sempre sangrada para servir a desígnios alheios e opostos aos seus. Não há, nunca houve, aqui um povo livre, regendo seu destino na busca de sua própria prosperidade."
O mundo colonial pujante que Darcy Ribeiro fala pode ser visto nas cidades históricas de Minas Gerais. Tive a oportunidade de viajar para algumas delas e a que mais impressiona, sem dúvida, é Ouro Preto. E que sorte a minha quando logo no primeiro dia aconteceu um réquiem na Igreja de São Francisco de Assis, a mais bela de todas. É difícil descrever quão lindas são as esculturas de Aleijadinho e as pinturas do Mestre Ataíde, verdadeiros artistas mulatos inseridos no mundo de ganância e segregação dos portugueses.
Quem visita a Casa dos Contos, também em Ouro Preto, percebe que toda aquela pujança não era para o gozo dos brasileiros. Na mesma construção que servia para a cunhagem do ouro que era enviado a Portugal, existe hoje uma exposição dos instrumentos de tortura dos escravos. Eis a sangria de que Darcy Ribeiro fala. Não há como negá-la.
Em Salvador, outro lugar onde até hoje é possível presenciar a riqueza do barroco brasileiro, a pujança também não pode ser alcançada pela massa pobre e pisoteada. A ostentação dos hotéis de luxo, os sofisticados restaurantes, as orlas privativas dos grandes resorts têm como razão de existência aquela turista espanhola assaltada na praia e não a multidão pobre da cidade, que apenas esmola as migalhas que caem das mãos ricas do turismo. Assim são os meninos e meninas que vendem fitas do Nosso Senhor do Bonfim, os cordeiros do carnaval, as menores que vendem a dignidade por dólares e euros nos night clubs e equinas de Amaralina.
O jovem negro com a marca do coturno no rosto é a viva fisionomia de que a sangria ainda não foi estancada. Não sei se ele é realmente culpado pelo assalto, nem posso dar um veredito sobre que punição ele mereceria se o tivesse cometido. Tento interpretar, no entanto, a mensagem que a ação do policial mal treinado passa: "este chão não é seu, nele você pode apenas sangrar para servir a desígnios alheios e opostos aos seus".
A sorte é que nosso povo cria seus próprios meios de plenitude. Nosso caldo cultural foi forjado na resistência, na insistência e na teimosia de expressar, por meios diversos, que este solo, que este Brasil, é nosso. Quem sabe não foi inspirado por uma teimosa brasilidade, que o Mestre Ataíde pintou a Nossa Senhora e os querubins à sua volta com expressões mulatas?
Assinar:
Postagens (Atom)